OS POSITIVOS

painting tha walls

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foto alheia

"Graffiti não seria graffiti se fosse legal… Seria apenas arte." responde o bomber quando lhe perguntam o que pensa de graffitis nos lugares autorizados. O título da notícia chega-nos para resumo: "Polícia de Roma apanha Geco, que pintou paredes em Lisboa e em meia Europa" 10 nov 2020, um outro basta-nos para ironias: “International search for the most lazy and persistent graffiti artist" 2020: lazy, mas a sua persistência valeu-lhe perseguição internacional. Talvez agora que o homem perdeu o anonimato haja uma reviravolta à-lá Banksy e todas aquelas associações de amigos das cidades que o acusavam de horrores civilizacionais se apressem a preservar os rabiscos.

Se la scritta Geco su un palazzo valesse 1 milione di euro lo definirebbe ancora un “vandalo”? Spero che tutto questo polverone porti all’artista una rivalsa mediatica e perché no, anche economica.
in "Geco è un vandalo e un artista, e sa bene il rischio che corre. Gli auguro il meglio" (*) "Geco is a vandal and an artist, and he knows the risk he runs. I wish him the best"11 nov 2020

Não vamos contribuir de modo enriquecedor o "debate sobre qual é a fronteira que separa a arte urbana do vandalismo" porque, OS POSITIVOS: graffiti é outra cena, sabem-nos pelos vândalos e perderam-nos no arte. Mas vamos notar sensibilidades próximas e outras afar. Próximas (*) ...mas, por analogia a outras não-artes.:

— Quem queres que seja o teu “público”?
— Muitos graffiti writers pintam apenas para que outros writers os vejam, portanto não visam sair do círculo e da comunidade do graffiti. Eu quero atingir toda a gente, os que pintam, os que não pintam, os que não gostam de graffiti.
in "Polícia de Roma apanha Geco, que pintou paredes em Lisboa e em meia Europa" 10 nov 2020

Já não partilhamos propósitos quanto a meios e fins: graffitis não ideológicos, exclusivamente para reconhecimento do seu nome.

  • Sou um bomber, quero espalhar o meu nome;
  • Com o meu nome “Geco” não procuro transmitir nenhuma mensagem particular;
in " 'Sou um bomber, quero espalhar o meu nome', diz Geco, o homem que reveste Lisboa de tags e graffitis" 27 ago 2018

Afinal cai na mesma inutilidade que praga todo o artsy-farsty, pelo menos com pontos em honestidade intelectual: as suas obras são literalmente-e-exclusivamente o seu nome artístico. Mas desse exercício recuperamos o que de útil podemos replicar ao mundo. Contrariando o próprio:

[O graffiti] não procura influenciar mentes, atitudes e comportamentos. Podem ser simples palavras que não remetem para ideologia nenhuma.
in " 'Sou um bomber, quero espalhar o meu nome', diz Geco, o homem que reveste Lisboa de tags e graffitis" 27 ago 2018

... exemplificamos com experiências passadas na primeira pessoa naquelas idades mais formativas. Uma escola decrépita (obviamente, pública) sem qualquer tag, graffiti ou apropriação "indevida" do espaço emana exactamente esse ambiente que sobrecarrega entre os seus alunos: um espaço abandonado sem pertença, um resquício em decadência de tempos idos a que se exige um respeito a sucessivas gerações que nunca o viveram noutro esplendor, e às quais lhes é interdito tornar seu. Tendo frequentado uma outra escola igualmente decrépita (*) Então, parece que entretanto houve renovações — esperemos que tenham preservado os tags — pun! cujas paredes eram uma gigantesca tela de graffiti, tags e todos os abusos imaginários em permanente transformação, nesta encontrámos uma maior vivência dos espaços e sentido de pertença na sua comunidade, uma que nunca se conseguiu no túmulo anterior.

Não vou tão profundo nesse significado mas… como é que se diz…? “Paredes brancas, povo mudo”. Quando vejo uma cidade cheia de graffiti fico com o sentimento que (...) a cidade está ativa.
in " 'Sou um bomber, quero espalhar o meu nome', diz Geco, o homem que reveste Lisboa de tags e graffitis" 27 ago 2018

Já se ambas as escolas não estivessem decrépitas, teríamos a mesma opinião do graffiti? Sem entrar em filosofia profunda e metáforas mal disfarçadas, mesma resposta de sempre: depende. Nem pró, nem contra: há bom e mau graffiti, quer em si quer no sítio onde o fazem. É caso-a-caso e assim é a vida. Não somos nem fundamentalistas do património nem do graffiti: teríamos zero chatices em pintar por cima de graffiti alheio, e quem se incomoda com isso não compreende a natureza do seu canal de comunicação e exige para si o mesmo estatuto de património que nega a outros. Não-não-não... Mas são pertinências académicas: de volta à realidade, as escolas estavam decrépitas, essas interessa discutir?

Neste ponto retomamos às palavras do próprio na entrevista antiga d'O Corvo 27 ago 2018:

Como (...) tenho de ir para todo o lado isso faz com que conheça Lisboa muito melhor que se não fizesse graffiti e provavelmente melhor do que a maioria das pessoas que vivem cá e fazem diariamente os mesmos caminhos. O graffiti leva-te a sítios onde não irias se não fosse para deixar a tua marca.
in " 'Sou um bomber, quero espalhar o meu nome', diz Geco, o homem que reveste Lisboa de tags e graffitis" 27 ago 2018

...e fechamos da poluição visual, quanto pouco se lhe deve a repulsa ao rabisco mal feito / mau gosto, a principal ofensa está no "ilegal", no gesto não autorizado, na utilização de uma superfície (privada mas pública) à vista de todos não sancionada por uma autoridade que a normalize ao consenso.

A maioria das pessoas que afirma [graffiti como sendo “poluição visual”] nem sequer pensa em criticar todos os spots publicitários gigantescos. Isso é realmente poluição visual, na minha opinião. Não adotam um ponto de vista crítico sobre isso porque assumem-no como legal e correto. São muitas as maneiras pelas quais somos agredidos visualmente e apontar o graffiti como poluição visual é estúpido.
in " 'Sou um bomber, quero espalhar o meu nome', diz Geco, o homem que reveste Lisboa de tags e graffitis" 27 ago 2018

Ofende-nos mais a completa impossibilidade de conseguir atravessar um espaço que se diz público sem ser bombardeado com mensagens patrocinadas, publicidades, apelo ao consumo. Tornou-se tão banal que poucos se ofendem com esse histerismo constante em rectânculos vários, outdoors, néons, placards, postes, fachadas inteiras de prédios, yadda. Com uma configuração cuidada das preferências do browser conseguimos a custo evitar o pior mercantilismo que nos exaspera online, mas IRL não temos qualquer dizer ou escolha ao que nos obrigam aqueles que têm o privilégio de pagar para nos invadir o dia? Não podemos “mudar de canal se o programa nos irrita” quando as ruas não são opcionais. Admitimos, sentimos uma satisfação particular quando taggam publicidade de rua, e uma leve brisa de liberdade quando rabiscam fora das linhas.

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