OS POSITIVOS

realismo capitalista 8

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« não há uma central de trocas »

Começamos do Estado Ama e como o big goverment funciona de libido ao neoconservadorismo e neoliberalismo cumprindo com o papel de bode expiatório ao fracasso da centralização do poder — mesmo quando as falhas que lhe são apontadas não lhe são atribuíveis, é ao Estado que se procura imputar responsabilidades — e concluímos que num mercado estalinista de burocracia descentralizada a nébula que dispersa essa nova autoridade não é o seu sucedâneo mais feliz, e pelo contrário, conducente a uma nova hipocrisia: no capitalismo tardio as responsabilidades apontáveis aos indivíduos que são eticamente reprováveis encontra causas nos abusos e erros corporativos que são sistémicos, mas a cegueira anterior desobriga e deflecte de volta ao Estado.

Exemplifica-se com a crise de 2008, cujo foco dos media recai em banqueiros individuais e falta de supervisão do Estado, e não nas causas sistémicas próprias do capitalismo ao qual os governos se desdobraram em agradar. Este acto de deflexão na culpabilidade de um Estado impotente coloca o ênfase no governo e nas acções de indivíduos irresponsáveis no seio do sistema $$$, e resulta da recusa inerente de aceitar as consequências do alinhamento ao capitalismo global, mas simultaneamente ao nível do inconsciente político denota a incapacidade de aceitar que não possa existir um controlo central de poder — mesmo se o que de mais aproximado exista a esse sejam os tais intercâmbios nublosos inexplicáveis exercidos por corporações sem responsabilidades sociais ou políticas.

A case of fetishist disavowal, perhaps — ‘we know perfectly well that the government is not pulling the strings, but nevertheless…’

Embora as pessoas sejam agora interpeladas como consumidores e o governo apresentado como uma comodidade ou um serviço, não conseguem deixar de pensar em si mesmas como (se fossem) cidadãos.

Saltamos temporariamente o exemplo fornecido neste ponto para voltarmos a ele em todo o seu esplendor no final do texto, e avancemos já para os exemplos seguintes, alterações climáticas e reciclagem. Introduzidos a propósito da discrepância entre dois capitalismos, o que pertence ao imaginário comum e como este realmente se materializa — pun intented! — regressa-se à burocracia descentralizada do mercado estalinista como estrutura, no qual se reforça que os imperativos impostos sobre o indivíduo acontecem ao nível do pré e do pós ideológico, por definição o sweet spot da ideologia.

The cause of eco-catastrophe is an impersonal structure which, even thou it is capable of production all matter of effects, is precisely not a subject capable of exercising responsibility. The required subject — a collective subject — does not exist, yet the crisis, like all the other global crisis we’re now facing, demands that it be constructed.

Pop ref em cima cita-se o "Parallax View" de Alan Pakula, um filme sobre conspirações, a impotência de as revelar, e como o próprio acto de o tentar fazer alimenta-as ao invés de as expor. Um exemplo do funcionamento de estrutura profunda do capitalismo: mesmo substituindo todos os gestores e banqueiros que ocupam uma posição nessa estrutura por outros gestores / banqueiros mais bem intencionados, os vícios inerentes desta mantém-se — a desilusão de muitos que enredam numa carreira em gerência com grandes expectativas resultam precisamente da ilusão que, uma vez em posição de poder poderiam mudar o sistema e não repetir os erros dos seus antecessores, mas —

— watch some one step into management and it’s usually not very long before the grey petrification of power starts to subsume them.

De volta então à ética. É um erro tentar impor uma responsabilidade individual que a estrutura deflecte — tentação pela qual o capitalismo se escuda colocando a culpa de abusos e distorções no indivíduo sem escrúpulos que se desvia das boas práticas, desviando de si a responsabilidade de tais actos. Uma evasão em dois passos: se a estrutura é sequer invocada — intencionalmente ou não — é-o apenas no ponto que o indivíduo que dela faz parte possa ser castigado; mas nesse momento as causas de tais abusos tornam-se abstractas, difusas, e sistémicas, que ninguém pode ser responsabilizado.

E o exemplo que poupámos para fecho de capítulo: o call center. Exemplo mais acabado — pun intended pt2! — e directo no qual a maioria das pessoas tem o seu contacto à ausência de um centro formal no capitalismo e das duas realidades divergentes que processos de esquecimento necessários à saúde mental colectiva permite combinar: por um lado, ao consumidor do capitalismo tardio é-lhe vendida a ilusão de um serviço sem falhas com um apoio permanente, por outro lado esta revela-se "um labirinto kafkiano sem memória, onde causa e efeito se comportam de modo misterioso, onde é um milagre que alguma coisa alguma vez aconteça, e se perde a esperança de regressar à outra realidade onde tudo funciona como suposto". Sem que, note-se, esse choque entre as duas realidades da experiência com os call centers consiga desenraizar a noção de que o capitalismo é inerentemente eficiente. Long cite:

The call center experience distils the political phenomenology of late capitalism: the boredom and frustration punctuated by cheerily piped PR, the repeating of the same dreary details many times to different poorly trained and badly informed operatives, the building rage that must remain impotent because it can have no legitimate object, since — as is very quickly clear to the caller —there is no-one who knows, and no-one who could do anything even if they could. Anger can only be a matter of venting; it is aggression in a vacuum, directed at someone who is a fellow victim of the system but with whom there is no possibility of communality. Just as the anger has no proper object, it will have no effect. In this experience of a system that is unresponsive, impersonal, centerless, abstract and fragmentary, you are as close as you can be to confronting the artificial stupidity of Capital in itself.

controlar a narrativa