OS POSITIVOS

reacionário ao fim de semana

hard right turn ahead

Três notas no aniversário de dividirmos assiduamente o nosso tempo entre cidade e nenhures.

1) Rodeados de uma natureza implacável, desprovidos de recursos para além das suas próprias mãos, obrigados a espremer o seu sustento da fauna e flora sujeitos aos caprichos das estações, não estranhamos que as classes rurais tenham sempre alinhado pelo conservadorismo, de alto a baixo avessos a inovações sociais. Do porquê dos senhores, nenhuma surpresa, é entre os mais humildes e remediados que os revolucionários demasiadas vezes erram em pressupor uma ânsia de liberdade & progresso. Bem-vindos na cidade (mais no fim...), quase nunca recebidos com qualquer alegria instantes após a invenção da roda, charrua, outras alfaias básicas: cada nova inovação aumenta o fosso entre vassalo e dom, um hiato acelerado a partir do limiar do proto-capitalismo na qual a relação de forças sempre tende ao desvalorizar do trabalho manual, aumentando a precariedade dos que dependem dela para a sobrevivência. Perguntem aos luddites de qualquer era. Perguntem-lhes também porque preferem subordinar-se a uma subsistência miserável, garantida, a adoptar as tecnologias que os substituem. Não nos alongaremos, todas as inquietações que os livros de história registam entre rurais têm invariavelmente origem na desordem da ordem. Rodeados dessas paisagens, constatamos corolário à dureza da sobrevivência mais primitiva: não há lugar à cultura. Essa exprime-se por rituais fossilizados, desvios não são encarados com complacência. Música, pintura, bailado de qualquer erudição, filosofia abstracta sem aplicação.

2) No advento do colapso da sociedade moderna reverteremos num piscar de olhos ao feudalismo medieval: economia local, submissos a quem possui a parte-leão das terras. Não acreditem em iluminismo-iluminado, colectivos de entre-ajuda, qualquer outra ordem social que não o pão para a boca mesmo que esse exija uma hierarquia de gentes. Sinto-o nos que me rodeiam: prestáveis e solícitos, alguns transpiram bondade na sua simplicidade, mas um refrão percorre impressões: "ajudo-te porque preciso que nunca precises da minha ajuda".

3) As cidades morrerão sem as suas veias globais. Uma pena, somos ratos de cidade. É nestas que a cultura encontra os seus laboratórios, é nestas que se respira liberdade. Notá-lo em pleno século XXI é um testemunho da resiliência do rural: esvaziam-se, desertificam-se, mas claro como a água que cairá do céu cada vez mais irregular, serão os sobreviventes da espécie na próxima pandemia invacinável. E os porta-estandarte da humanidade nesse futuro incerto não serão progressistas, senhores.

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