OS POSITIVOS

liberdade

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ainda o mesmo filme

sem spoilers? não acaba bem

De que serve a liberdade se não a vivemos? Compromissos portanto, parêntesis na BD para regressar ao Cinema, talvez o seu parente mais próximo entre ofícios. Segue-se um excerto da entrevista recente a Paul Schrader no The New Yorker 22 abr 2021, de quem devíamos relembrar créditos em filmes celebrados como o Taxi Driver 1976 mas preferimos trazer-vos à memória o mal afamado Dog Eat Dog 2016, um "lairy, nasty, tasty crime thriller built on black-comic chaos" por ambientes de "oppressive ugliness" que "looks like it was shot on the cheap" wikipedia e que o próprio renega: "I’ve made some important films. Dog Eat Dog is not one of them" 13 nov 2016. Ficha feita, onde nos toca: estatutos à gaveta, caminhos alternativos, o $$$.

Well, there’s a lot of freedom.

[Question] So do you think that because filmmakers are likely not to have the same resources, the same amount of money, the same budget level to make feature films that they would have, say, twenty years ago, is there a certain freedom that comes with this?
[Answer] Everything is cheaper. Everything is faster. So the upside is that movies that could not afford to be made are now being made. Anybody can make a movie. Anybody who has a phone can make a movie. The downside is, although anybody can make a movie, nobody can make a living. [...] So many of these young filmmakers are . . . they’re making films they weren’t allowed to make before, but they’re not making a living, and they’re not getting the kind of distribution . . . I mean, you see it all the time, films that are just being thrown out the car window hoping somebody finds them and watches them.
[Question] Which gives films critics a role again, one hopes.
[Answer] Yeah, if they can find somebody to pay them.
in "Paul Schrader on Making and Watching Movies in the Age of Netflix" 22 abr 2021

O último Q&A é pura maldade nossa. Seguindo,

Começámos a estudar cinema quando se ensaiava a sua digitalização. Todo o processo era ainda analógico, dependente de maquinaria pesada, um computador nestes domínios era tão prático como um carro estacionado no fundo do mar, e olhado com a mesma estranheza. Nem no auxílio à produção se usava uma simples folha de Excel, semanas de planificação espalhavam-se por dossiês sempre mais volumosos e caóticos. A acrescentar ao caos, nem telemóveis nem emails eram parte do processo. Oh, bliss!

Aventurámos-mos nesse maravilhoso mundo novo numa mesa de montagem que permitia fazer em minutos o que demorava horas. Além de acelerar o processo, melhorava-o: podíamos fazer outras coisas, mais coisas. Algum tempo depois chegavam as primeiras câmaras com uma outra mobilidade e autonomia, tradução: mais liberdade. Eventualmente toda a linha de produção se convertia à desnecessidade de converter formatos, agilizando criatividades e diminuindo custos. Quando finalmente até as salas de cinema se rendiam às modas já a electrónica de consumo metia nas mãos de qualquer um o aparato necessário para produzir de casa o que antes ocupava um estúdio. Mais do que lamentar o fim das cassetes, rolos, fitas, yadda, celebramos o acesso aos meios de produção e a sua desmaterialização — insiram aqui as vossas interpretações em manifestos capitais. Tivemos colegas que concluíram curso sem ligar um computador, nós seguimos outras direções, mais em sintonia com o espírito dos tempos.

Hélas, o $$$. Não nos imaginem românticos a viver do ar, antes realistas pragmáticos a raspar o niilismo, e do cume dessa malvadez absolutamente recusamos misturas entre profissões com aquilo que é do none of ur business (pun!), particularmente por ambientes subordinados à lógica de valores pecuniários que distorcem valores maiores, indiferentes se não mesmo antagónicos. Idealmente, profissionalmente, ocupem-se com algo que vos satisfaça e pague as contas, pior cenário algo que não vos atrapalhe e pague as contas. Conhecem-nos, a nossa costela Do It Yourself exige-nos que o façamos nós mesmo, podemos até procurar a ajuda de outros mas qualquer compromisso em intenções é morrer por a thousand deaths. Temos prazer no acto, quando masturbamos a mente sinapses acendem-se como meteoritos a queimar na atmosfera, universos interiores expandem-se, constelações rodopiam, um prazer involuntário rasga-se no rosto, sintonizamos a frequência mais próxima de um sentido de vida que conseguimos alcançar (*) Alguma música consegue-nos o mesmo, mesmo se a sua relação à BD seja mais sinuosa quando comparada ao Cinema.. Debater minúcias de projectos de terceiros com task forces inconstantes para realizar a visão de alguém-que-não-sei-quem no entra e sai de salas de reuniões agendadas entre outros afazeres dificilmente nos consegue o mesmo orgasmo existencial (*) Fun trivia só para complicar: este vosso escriba e a sua parceira são colegas de trabalho. Ah! Anyhooos---. Arrepiam-nos aqueles que não têm dificuldade em separar o pessoal do profissional e no entanto colocam na esfera do profissional aquilo que é indissociável do pessoal: só os piores iludidos da cartilha neoliberal confundem o essencial de uma pessoa como negociável por forças de mercado do dog eat dog. Não, senhores, não... Hélas-hélas, outros crêem que sim e obrigam-nos ao mesmo filme vezes sem conta. Talvez um dia o final mude. Entretanto insistimos: não é necessária a maquinaria pesada de outros tempos para esta revolução, cada um de vocês pode fazer a sua sequela deste filme.


Atrás: artist rendition. Pela hora de almoço ainda era business as usual, pun intended.


business as usual