OS POSITIVOS

o modernista consciente, o medium e desígnios antigos

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Para compreendermos as manifestações da cultura pós-moderna, será oportuno analisarmos três fenómenos contemporâneos: o i) establishment modernista, o ii) kitsch e a iii) pop.
Roger Scruton in “A Cultura Moderna” 1998

Interligadas, as três (*) "♪ it's a magic number ♪" são “as formas vultuosas que repousam no areal do lazer humano enquanto a alta cultura recua”. Só por este capítulo vale o livro e obrigar-nos-á a alguma ginástica para o abreviar em highlights. Mas!-para-uma-próxima-ocasião, teaser feito e porque estragar o lazer de outros humanos não nos é tarefa mas repouso, antes de passarmos da religião à alta cultura pós-moderna, um twist: a definição da modernidade pelo nosso "intelectual inglês mais influente desde Edmund Burke". Ainda Roger Scruton, "conhecido pelo seu conservadorismo", ainda a sua defesa da alta cultura contra os "ataques do desconstrutivismo e demais correntes dos chamados Estudos Culturais", mas antecedendo o festim prometido é-nos oportuno analisarmos um fenónemo extemporâneo: a sua definição de modernidade avançada aos pés do capítulo "Vanguarda e Kitsch". In a nutshell e estamos a parafrasear, modernismo, uma tentativa de regresso às tradições do passado.

Desenvolvendo: a "mercantilização da vida moderna" trouxe-nos o modernismo (*) E outras “teorias ambiciosas” e “algumas abordagens menos proeminentes”. Nas primeiras cita-se Marx e o fetichismo da mercadoria, o consumo conspícuo de Thorstein Veblen, sociedade da abundância de J.K. Galbraith. por reação:

Se queremos entender o movimento modernista devemos encará-lo como o despertar definitivo e sobressaltado da alta cultura para a verdade do mundo moderno: o mundo no qual tudo está à venda. Num mundo onde tudo está à venda, o artista muda-se em modernista e a cultura refugia-se numa divisão inacessível, bem acima do mercado. Tal é a tarefa do poeta moderno: manifestar uma consciência viva e ajuizadora num mundo que não se deixa ajuizar. A tradição (*) “Aqui é importante mencionar que a tentativa consciente do fazer parte de uma tradição — e até o próprio conceito de tradição — são fenómenos modernos.” reveste-se de extrema importância para o artista moderno, já que define a perspetiva que sustenta o juízo. O modernista é aquele que, conscientemente, reformula o medium para acolher desígnios antigos — ...para demonstrar a proximidade entre os seus desígnios e os que estiveram na origem da arte do passado. O modernista é o único que tem a preocupação de se manter fiel a um empreendimento artístico que deve ser refeito para que possa continuar a existir.
Roger Scruton in “A Cultura Moderna” 1998

E aqui o money-shot:

um cinismo calculista começa a tomar conta do discurso humano — a própria arte desdenha o que resta da cultura

A primeira diligência do modernismo consistiu em tornar difícil a alta cultura: erguer em torno da beleza uma muralha de erudição. Este intento escondia um duplo propósito: por um lado, proteger a arte da influência do entretenimento popular; por outro lado, criar uma nova barreira, um novo obstáculo à afiliação e um novo rito de passagem para o mundo adulto e esclarecido. Para aqueles que ficaram de fora do movimento modernista, este tomou a aparência de uma traição ao passado. Todos os caminhos que a arte encontrara para acolher nos seus braços o ser humano comum na música, a tonalidade e a melodia; na pintura, a imagem humana; a dignidade encantadora da métrica e da rima, e até o consolo singelo de uma história bem contada — foram subitamente rejeitados, como se de um abraço desonesto se tratasse. Porém, para os modernistas o passado não tinha sido traído pelo modernismo, mas pela cultura popular. Tudo, no mundo dos indivíduos naïf e irrefletidos, era kitsch. O modernismo não foi uma investida contra a tradição artística, mas uma tentativa de a resgatar.
Roger Scruton in “A Cultura Moderna” 1998

Definida esta modernidade de causas insuspeitas, fade in no presente com as consequências conhecidas. A tentativa de resgate acima terminou em massacre e começamos cena num funeral. Numa lápide lê-se“devemos sempre reverenciar os heróis modernistas, mas o mundo mudou e a agenda desses heróis pode não ser a nossa”.

Ao velar a sepultura da antiga religião, o modernismo reteve, ao longo dos anos, a sua dignidade supernatural. Mas a sepultura é cada vez menos visitada, e o movimento começa a parecer cada vez mais redundante e absurdo. Sem o móbil religioso e a reverência arraigada que se dirige a um texto sagrado, as dificuldades levantadas pela alta cultura parecem ser um preço excessivo a pagar por um privilégio dúbio.
Roger Scruton in “A Cultura Moderna” 1998

Conhecem-nos aversões no "pagar por": é sempre um dilema. Como muitos. Todos têm os seus.

Surge, nesta altura, aquele que veio a tornar-se o dilema moral mais premente para todos os que ensinam Humanidades. Devemos tentar transmitir a nossa cultura à juventude, sabendo que só nos é possível fazê-lo se exigirmos aos jovens determinados esforços que os próprios poderão achar inúteis? Ou devemos permitir que façam o que bem desejarem, deixando a cultura que nos moldou, e que nos oferece imagens duradouras de valor, em risco de extinção? Estas questões definem o impasse pós-moderno.
Roger Scruton in “A Cultura Moderna” 1998

Próximo: no oposto das "imagens duradouras de valor". We-be-back.

falso