OS POSITIVOS

uma introdução / summer project 2015

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"Monkeys as Judges of Art" de Gabriel von Max, 1889

critics & criticism

imagem: retnull.com/index.php?/texts/the-crit/

Este verão lançamo-nos num novo projecto de crítica e crítica à crítica, no que provavelmente se transformará numa web série recorrente nOS POSITIVOS para nos entreter no nosso downtime.

A tentação de ditar sobre as predileções de cada um surpreende-nos e é-nos por demais inacessível ao entendimento, razão à qual no confronto de ideias somos críticos da crítica onde esta se ocupa do juízo dos gostos.

A única crítica que nos merece consideração é a que aprecia o seu objecto no plano a que este se propõe, mesmo — ou, particularmente — se o autor da peça ainda ignora esse mesmo plano a que se dá. Uma conjunção adequada do objecto pela crítica amplia o seu alcance, uma desígnio benéfico para o público, e igualmente para criador e crítico.

Mas no exercício da crítica, este último demasiadas vezes confunde a sua incumbência julgando-se também ele autor a partejar peça própria. A sua inaptidão para o fazer — que nada deve à inaptidão de outros para o seu reconhecimento — empurra-o com ou sem consciência para uma carreira à sombra da carreira falhada. Ora a tentação do crítico para parasitar o objecto da sua referência em deambulações particulares não o tornam apenso ao mesmo se apenas tangencialmente o invocam e mais azo consagram às suas euforias. Ao exibicionismo de subjetivações a que o crítico pretende atribuir uma legitimação absoluta apenas reservamos desprezo.

Poucos domínios são mais coniventes à crítica do que a Arte, e contra esta perdura um imenso ruído de intenções fantásticas do igualmente fantástico universo da banda desenhada. Façamos pois a nossa penitência anual.

Já o afirmámos que nem toda a banda desenhada é arte, e, sobretudo, não acolhemos, de todo, que a melhor BD seja aquela dada a reivindicações artísticas — pelo contrário, e assaz em acordo com a sua própria definição, quando menos “artística” esta for mais significado lhe atribuímos: a primeira esgota-se nos preceitos da criação, mero exercício de manufactura, a segunda invoca uma intenção além da peça, um meio para um outro fim. Pessoalmente, damos preferência por fins que alternem entre o humorístico e o depressivo com espaço para o comentário social e a propaganda veggie anti-nazi, mas somos os primeiros a não sentenciar quaisquer outros fins, se e quando esses existem.

No verão passado relatámos a nossa dificuldade em encontrar indícios de qualquer desígnio digno de retenção, e atribuímos parte da inutilidade da demanda à boçalidade da classe de especialistas que mais uma vez nos ocupa neste espaço: o crítico. Citemos:

À constante arduidade de encontrar objeto que nos retorça uma ideia original, uma descoberta recente, uma trajetória firmada — e sobretudo, uma consequência —, encontramos igual paralelo no mesmo vozeirar constante da espécie em causa sobre as supramencionadas dificuldades de materializar genuíno entusiasmo onde este persiste em não se expor. Mas — e é da nossa proposição examinar tal curioso facto — em momento algum a altercação alcança inferências ao seu papel na esterilidade geral que grassa o meio. A ironia.
in Real Nós

Então defendemos que “não há espaço para uma crítica credível quando todos são críticos ainda que ninguém critique” e desde então não descortinámos — e tentámos!... — crítica alguma digna de registo no panorama nacional salvo raras exceções. Mantemos pois que “a qualidade da BD produzida é equiparável à qualidade da crítica que lhe é feita” e “persistimos na nossa tese de que a débil condição da BD neste país não deriva de uma qualquer imbecilidade do público que a desconsidera mas da insuficiência inerente à BD com que são brindados, na qual devemos agregar à responsabilidade do autor e editor a do crítico sazonal”. Lamentámos que “a crítica nacional de banda desenhada é amadora, inconsequente, incoerente, irrelevante”, e cada vez menos temos esperança que “alguém com vontade suficiente para acusar sem rodeios ‘isto é um insulto aos leitores e uma total perda do seu tempo’” se acerque a terreiro. (*) Para mais insultos gratuitos ao crítico, ler artigo na sua plenitude.

E este ano, a epifania: a crítica é má. Porque é boa. E dispensável. Dispensável, mas inexistente. E sobretudo, porque precisa de ser má. Para ser boa. Sejamos então, a bem da BD, muito — muito — maus críticos! Autênticos cretinos e pulhas. Critiquemos, e no processo, critiquemos a crítica. Oh, a tal da ironia.

Francisco Sousa Lobo